Decidi que seria publicitário ainda adolescente, aos 13 anos, mas tive a certeza de que havia feito a escolha certa aos 19, já trabalhando numa agência.
Foi quando li um anúncio de uma associação norte-americana, que se dedicava a ensinar profissões a pessoas com deficiência física.
O anúncio mostrava uma foto em preto e branco de um homem numa cadeira de rodas, consertando um televisor. Em cima da foto havia um título que chamava a atenção para o texto que podia ser lido logo abaixo.
O título era: “Você está vendo uma televisão consertando um homem”.
Quando li aquilo, tive a certeza de que queria passar a minha vida inteira tentando escrever frases surpreendentes, para vender causas, ideias ou produtos.
De lá pra cá, tive a oportunidade de criar alguns bons anúncios e de ler muitos outros.
Lembro-me de alguns e das circunstâncias em que foram feitos.
Criado para a fábrica de automóveis Willys, que foi vendida para a Ford, mas continuou vendendo os veículos com sua marca. Título: “Faça como a Ford: compre Willys”.
Criado para a máquina Itauchek, um serviço do banco Itaú precursor dos caixas automáticos. Título: “Hoje, 1º de maio, o caixa eletrônico Itaú estará trabalhando normalmente como se fosse 7 de setembro, 15 de novembro, 25 de dezembro ou 1º de janeiro”.
Criado para o banco Bozano, Simonsen, recomendando que as pessoas investissem em ouro e ilustrado com a foto de um lingote. Título: “In Gold We Trust”.
Criado para a BomBril S.A. comunicando oficialmente o número de seu novo telefone. Título: “BomBril limpa, dá brilho, não risca e às vezes troca o número do telefone”.
Criado para o lançamento da VW nos EUA, numa época em que a filosofia dos americanos era think big (pense grande), e a maioria dos carros era enorme como os Cadillacs rabo de peixe. Ilustrado com a foto de um pequeno Fusquinha. Título: “Think Small”.
Criado para a Itaú Seguros vender seu seguro de vida e ilustrado com a foto de uma mulher e seus dois filhos sentados num sofá, assistindo à televisão. Título: “Estava ficando quase rico. Deixou a família quase pobre”.
Criado para o Dia dos Pais para as copiadoras Xerox. Título: “Cuide bem do seu pai. Ele não tem cópia”.
Criado para o Dia da Criança para a empresa de varejo Fotoptica. Título: “O melhor presente que você pode dar pro seu filho é parar de encher o saquinho dele”.
Criado para o SBT quando era o segundo colocado em audiência, bem atrás da TV Globo, mas bem à frente das outras emissoras. Título: “SBT. Liderança absoluta do segundo lugar”.
Criado para a Conselho Nacional de Propaganda, quando, depois do fim da Guerra do Vietnã, alguns grã-finos paulistas começaram a dizer que adotariam órfãos vietnamitas. Título: “Prestigie o produto nacional; em vez de um órfão do Vietnã, adote um menor abandonado do Brasil”.
Criado para a Singer e ilustrado com a foto de uma senhora de meia-idade, trabalhando numa máquina de costura. Título: “Em casa que tem máquina de costura, nunca falta pão”.
Criado para a Fiat Automóveis logo depois de ela ter comprado a Ferrari, ilustrado com uma foto do senhor Enzo Ferrari dirigindo um Fiat 128. Título: “Mr. Ferrari drives a Fiat”.
Curiosidade: nenhum desses brilhantes anúncios foi criado ou veiculado nos últimos tempos. Certamente, porque com a onda do politicamente correto, a presença da internet e das redes sociais e a disseminação dos cancelamentos, a existência de anúncios fora de série tem se tornado cada vez mais rara.
O mais talentoso anúncio que li nos últimos tempos não foi criado para vender nenhuma causa, ideia ou produto. Na verdade, não é um anúncio, é um poema da série “Poemas classificados”, do poeta Bruno Félix, que usou o espaço dos anúncios classificados como veículo para divulgar seu trabalho.
Entre todos os publicados, o que mais me encantou foi um com o título “Vendo Imóvel”.
Conto com a sua boa vontade para imaginar esse anúncio, dentro do pequeno retângulo de um classificado de jornal:
VENDO IMÓVEL
Em ótima localização
Te vi passando
Pela primeira vez
E à primeira vista
Fiquei assim, sem
reação:
Vendo, imóvel.
Washington Olivetto
Publicitário
Texto publicado no jornal O Globo e compartilhado no Clube de Criação, na Coluna do W.O. (aqui)
Segue abaixo o anúncio citado pelo Olivetto no começo deste texto.
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