Encontrei esta publicação em um blog que o Alex Periscinoto manteve ativo na Globo, em meados de 2010. Eu estava a procura de outro conteúdo, mas este chamou a atenção. Resolvi publicar o texto do Alex na integra por aqui. Boa leitura.
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Se existisse na publicidade o cemitério de ideias mortas, a lápide que mais se veria seria esta: “Aqui jaz um anúncio alltype”. Isso porque um anúncio que aposta tudo no título e texto, colocando o visual como simples coadjuvante – geralmente um simples logotipo ou uma foto básica do produto, não se aguenta em pé se não estiver fincado numa p. sacada do redator. A falta de uma frase matadora e uma argumentação brilhante que consiga o milagre de fazer o consumidor ler o anúncio, ou até mais, que consiga irritar todos demais redatores que não tiveram aquele momento de brilho, sem isso, o anúncio é só um amontoado de letrinhas. Não impacta, não mexe com o emocional do leitor. É a materialização do nada.
Redator estilo Nossa Senhora de Fátima.
Pra agência se aventurar nesse terreno escorregadio do anúncio all type, ela tem que ter no time criativo pelo menos um, unzinho, redator absolutamente out standing, um atirador de elite. Se for um redator estilo Nossa-Senhora-de-Fátima – cujo texto brilhante só foi visto uma vez e por apenas três pessoas, esse não é o cara. O sujeito tem que ser bão, mesmo. Tem que ser aquela peça rara com sólida cultura e leituras além dos anuários. Eu tive no meu time de redatores da Almap (onde nos anos 60 dei um looping no formato da criação publicitária brasileira trazendo pra cá o método da lendária DDB de Nova Iorque com as duplas interagindo e cujo ícone da redação, Bill Bernbach, se tornou meu amigo pessoal), como dizia, eu tive o privilégio de poder contar com esse tipo de redator que torcia pra ser o solista fazendo do espaço do anúncio uma vitrine pro seu talento. Mas, na contra-mão disso, também tive os que suavam frio, bebiam antiácido direto da garrafinha e rezavam pro diretor-de-arte salvar a pátria com uma sacada visual tão soberba que ninguém perceberia o título e texto chinfrins.
Köszõnõm szépen.
Estou esguichando essa conversa toda sobre esse tipo de peça provocado pelo anúncio húngaro aí de cima. É o velho, clássico, gasto e sambado all type com o pecado mortal que mencionei no título do post. Ou seja, sem a pegada poderosa de um redator excepcional. O título-texto é banal, com um jogo de palavras que já foi uma moda pobrinha por aqui nos anos 80 onde o redator brincava colocando palavras de sentidos opostos na mesma frase, tal e qual fizeram os copywriters húngaros (“a pequena diferença faz a grande diferença”). Apesar de tudo, eu daria um crédito aos rapazes lembrando que a publicidade na Hungria ainda é um bebê recém-nascido, pois até outro dia a economia do país era prisioneira das botinas de ferro da falida União Soviética mediocrizada pela estatização. Ou seja, um anti-cenário pra competitividade de mercado que gera o oxigênio que dá vida à publicidade permitindo que ela cresça, apareça, se profissionalize e semeie talentos. Os criativos húngaros levam jeito. Com certeza eles vão aprender rapidinho e vou torcer pros seus redatores passarem longe do cacoete bobão de se inventar palavras tais como “imbatível”, “imperdível”, etc. Que, aliás, se já são “indigeríveis” em português, imagine em húngaro com suas 14 vogais, 27 consoantes e onde “obrigado” escreve-se köszõnõm szépen.
Crédito dos anúncios:
Agência: Grey/G2, Budapest, Hungary
Diretor de Criação: Gábor Spielmann
Diretor de Arte: István Bene
Redator: Dániel Barabás, Gábor Spielmann